sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Interlúdio - Bônus.

Bom, confesso que a inspiração para criar a história abaixo já estava tomando-me por completo a ponto de desenvolver toda a introdução em plena madrugada. E admito que meu resultado se mostrou bastante superior ao de antigamente.

Um amigo meu - e minha namorada também. - disse que esse foi o melhor texto que já escrevi em muito tempo. Acredito que fugi bastante da minha linha de escrita, que costuma ser ficção científica, pouco explorada no mercado brasileiro de livros, imagino. Mas isso não quer dizer que eu não vá abandonar essa minha vertente, tanto que escrevo um livro nesse estilo com o amigo citado antes. Ele se chama Raffael (clique em seu nome para ver o perfil no blogspot).

Ele e eu pensamos quase da mesma forma, escrevemos mais ou menos igual e nossas ideias se juntam de maneira absurda. E claro, escrevemos por pura paixão pelo ato de contar uma história.

Isso me levou a criar o texto abaixo que, na continuidade, será um futuro livro que eu tenho certeza que irei produzir, pois a ideia, ao menos na minha cabeça, é intrigante e uma ótima trama. Quem sabe eu esteja errado, mas... Pode dar opiniões negativas, positivas e etc., pois só assim melhoramos em qualquer outra coisa que tentarmos. :D

É isso, pessoal.

Interlúdio.

Interlúdio

O tique taque do relógio soava tranquilamente, fazendo as horas passarem como uma pequenina procissão daqueles em uma quietude controlada. Mal iluminado por luzes frias e que falhavam de hora em hora, o recinto assemelhava-se a um lugar assustador onde ninguém deveria estar; ninguém deveria enfrentar. Ao menos não sozinho.

Os bips pausados da máquina que marca os batimentos cardíacos da paciente estavam trabalhando. Enquanto funcionassem, o sangue seria bombeado por entre as artérias para todo o corpo, carregando hemácias de vida e frustração, mantendo a carne viva. Porém o cérebro mantinha-se entorpecido e em algum lugar estava a consciência daquela menina, mas com certeza não era ali, onde ninguém deveria estar sozinho.

A respiração abafada da menina completava os tiques taques e bips de maneira melancólica, dando a impressão de que a qualquer minuto, ela podia falhar e os bips poderiam transformar-se em um único som: um apito. O assustador apito. O prelúdio para a partida do mundo de dor e desespero para a tão desejada paz.

Morte.

Sentado na cadeira ao lado da cama da menina, havia um homem. Cabelos castanhos levemente esbranquiçados bagunçados de maneira selvagem pela vida e seus acontecimentos. Ela privou-lhe de seu grande amor e estava querendo tomar-lhe outro. O único amor que mantinha sua pouca sanidade intacta, seu único solo seguro e seu único sentimento de vida fluindo por seu corpo. Olheiras fundas e olhos vermelhos, aquele homem apertava a mão delicada da menina, envolvendo-a com as suas.

Havia uma peculiaridade: jazia uma luva negra de couro na mão direita do indivíduo, tal qual esta ele não fazia questão de tirar para sentir a pele suave de sua filha, temendo que isso o machucasse ainda mais.

Tão perto... Mas ainda assim, tão distante...

Era o pensamento que permanecia na mente do homem. Seus ombros pesaram, assim como sua cabeça. Os olhos começaram a arder, ameaçando lançar para o mundo exterior as mazelas que aquele indivíduo carregava no peito com tamanha força de vontade. Ou seria necessidade? Sentiu uma vibração no lado direito de seu corpo, seguido de uma melodia eletrônica.

A realidade estava chamando. Sacou do bolso da jaqueta seu telefone celular, antes conferindo o número que ligava. Roberto Abreu. Era o que dizia no visor colorido. Respirou fundo e tossiu duas vezes antes de atender.

- Martins.
- Preciso de você no Centro, Igor – disse Roberto.
- O que aconteceu?
- Fabiano Inácio foi encontrado morto na porta de seu edifício, no Centro – falou melancolicamente a voz do outro lado da linha. – Aparentemente ele caiu da janela de seu apartamento direto no meio fio.

Fabiano Inácio. Na mente do Detetive do Departamento de Homicídios de Niterói, Igor Martins, o nome do jornalista investigativo mais famoso do momento lhe trazia algumas lembranças, já que o salvou do perigo diversas vezes enquanto realizava suas matérias altamente perigosas. Não o considerava como “amigo”, mas sua morte lhe rendeu um calafrio assombroso. Como se a Morte estivesse por perto, pronta para tirar mais um pedaço seu. Apertou a mão de sua filha enquanto respondia seu superior.

- OK – confirmou Igor. – Já estou indo. Onde está Helena?
- A caminho.
- Tudo bem – assentiu ele. – Chego lá em 10 minutos.

E desligou. Pensou em todos que poderiam considerar sua pessoa como um “amigo”. Infelizmente, Igor não se dava ao luxo de ter amigos, pois não queria presenciar novamente tudo que já tinha lhe acontecido em seus vividos 43 anos: dor, sofrimento, tortura, ódio. Aproximou-se da mão da menina e tocou com seus lábios em um beijo triste, onde tentaria enviar o que lhe restava de vida no peito para ela, na esperança de que houvesse um sopro de existência e a reanimação de sua consciência.

Por mais que tudo que tenha a oferecer seja uma energia impura, tinha a expectativa do corpo da menina purificar tudo aquilo de ruim para algo puro, brilhante, cheio de vida.

- Eu te amo, Luisa, meu amor... Papai já volta, tá bom? Fique bem, pequeno anjo.

E assim, hesitante, Igor largou a pequenina mão de sua filha Luisa. Levantou-se da cadeira e deu uma última olhada. Sua filha tinha apenas treze anos. Seus cabelos longos e castanhos claros estavam bagunçados sobre a colcha branca hospitalar, desenhando uma estranha estampa sobre esta. Seus olhos fechados e sua boca coberta pela máscara de gás. Ferimentos leves em regeneração estavam à mostra em seus braços e em seus lóbulos. Sua expressão era serena, passiva, silenciosa. O único barulho produzido pela menina era o de sua respiração. Seu sopro de vida. Sua esperança.

Sorrindo, Igor se virou, empunhando a maçaneta com a mão enluvada, secando as lágrimas com a manga esquerda da jaqueta e transformando completamente sua expressão enquanto deixava o quarto do hospital onde Luisa Andrade Martins era mantida. Ao bater a porta, todas suas fraquezas, dores e incertezas eram enterradas no fundo de seu peito, dando lugar a poder, resistência e certezas.

Havia um caso para resolver e um sádico para capturar. Toda a atenção era necessária.

Foco, Igor. Foco!

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A Detetive Helena Vasconcellos fora convocada por seu chefe, o Delegado Abreu para um serviço inesperado. Era uma noite de sexta feira às 23h27 da noite. Sexta feira para todo policial é sagrada. E para a detetive não era diferente. Havia marcado com seus amigos e amigas da faculdade de psicologia para uma churrascaria no Centro do Rio de Janeiro, onde poderia relaxar e falar sobre todo tipo de assuntos com seus amigos e tentar não respirar o ar da delegacia pelo menos uma vez no dia. Quando seu chefe ligou, estava a saborear a melhor fatia de picanha que já havia provado em muito tempo. Bem passada e no ponto. Do jeito que Helena gostava.

Quando apanhou o celular da bolsa e viu o nome na tela, engoliu tudo que estava a mastigar, quase se engasgando no processo. Não muito preparada, Helena atendeu.

- Oi chefe – disse ela sem graça.
- Helena, onde está? – Abreu indagou depressa.
- No Centro do Rio, por quê? – o final da frase pode ter saído um tanto confuso, pois Helena tossiu e cobriu a boca com uma das mãos.
- Quero que você vá para o centro de Niterói. Fabiano Inácio está morto. Caiu da janela de seu apartamento, no sexto andar.
- Se ele caiu, por que então enviar um detetive? – indagou Helena.
- Não temos provas concretas de que ele realmente caiu. Os vizinhos ouviram uma discussão antes do silêncio absoluto – replicou Abreu. – Não ouse desacatar uma ordem direta, Vasconcellos. Vá para lá agora – ordenou ele.
- Tudo bem, tudo bem – praguejou ela. – Já vou, já vou. Vasconcellos desligando.

Devolveu o telefone para sua bolsa e levantou-se. Um de seus amigos manifestou-se e Helena sequer deu tempo para ele efetuar a pergunta.

- Coisa do trabalho, gente, desculpa, tenho que ir rápido.
- A gente entende Helena. É uma pena você sair. Hoje é sexta feira! – exclamou uma de suas amigas, uma loira de aproximadamente 22 anos.
- Eu sei que é sexta, Lúcia, mas o meu chefe me quer em Niterói o mais rápido possível, então – disse ela vasculhando sua carteira e dando vinte reais para a amiga. – Tomara que isso pague minha parte. Se eu precisar cobrir alguém depois, me liguem. Fui!

Não havia tempo para despedidas formais. Um mistério a aguardava. Era a segunda coisa na face da Terra que despertava a atenção da Detetive Vasconcellos: mistérios! Ah, nada melhor que enfrentar criptogramas complexos uma vez ou outra, assim como calcular velocidades médias, influência de atrito ou gravidade em um corpo que despenca de um sexto andar. Nada a fascinava mais.

Adentrou em seu carro, um Volkswagen Crossfox cinza chumbo e antes de dar a partida, tinha que se arrumar. Usando o retrovisor do carro, amarrou seus cabelos pretos repicados em um coque mal-feito, jogando sua larga franja para o lado, a fim de limpar sua visão para qualquer pista na cena do crime. Esta era uma das verdades sobre Helena Vasconcellos: além de talentosa, vaidosa.

O coque fazia com que seus grandes olhos castanhos ficassem ainda mais destacados e aproveitou para retocar o delineador preto. Desenhou uma leve puxada côncava nas laterais de cada olho, fazendo com que ficasse vagamente baseado em um desenho ocular egípcio.

Estava vestida como todo dia: blusa baby-look preta de uma de suas bandas preferidas, os Sex Pistols, calça jeans skinny clara da marca Colcci discretamente rasgada em alguns pontos das coxas e tênis Running pretos da marca Adidas. Ao ligar o carro, checou o relógio de pulso e percebeu que haviam se passado sete minutos desde que deixara a churrascaria. Manobrou o veículo para fora da vaga e acelerou pelas ruas da cidade do Rio e Janeiro.

Por ser uma mulher, Helena tinha que se impor sempre que possível dentro do departamento. Quando começou, era uma pré-adulta inocente, sem muita noção do novo mundo que a aguardava. Foi alvo de olhares maliciosos de seus colegas de setor, já que costumava se arrumar melhor que muitas outras policiais, o que causou certo alvoroço entre os homens. Uma vez, no banheiro feminino, um policial chamado Eduardo tentou assediá-la.

Infelizmente, naquele dia, Helena havia terminado seu namoro de nove meses com seu namorado, Gaspar, um estudante de Direito da UERJ. E ela estava furiosa. Naquele dia, houve testemunhas dentro do banheiro que atestaram a inocência de Helena, que quebrou o nariz de Eduardo e o deixou 5% cego do olho esquerdo em legítima defesa. Desde então, nenhum homem ousou encostar-lhe um dedo. E ainda por cima, ganhou o apelido de A Pequena Punk.

Igor Martins foi designado como seu parceiro alguns meses depois deste incidente.

A detetive vê Igor como um homem problemático, que suporta uma mágoa que não foi responsável por causar, decidindo fechar-se para o mundo após ter visto tanta dor e sofrimento àqueles que o cercavam. Mas isso não impediu Helena de socializar-se com o problemático detetive. Criou um vínculo com ele. Aquele vínculo de Mestre/Professor.

E sabia que Igor era alguém com quem ela sempre podia contar, não importa a ocasião. Ainda provaria desta lealdade um dia. Ela sentia isso.

Enquanto dirigia, escutava I Wanna Be Sedated da banda Ramones e idealizava todas as variáveis para o “suicídio” de Fabiano Inácio. Atestou que ele jamais seria capaz de fazer isso, já que poderia ser considerado um narcisista. Algo externo havia causado isso. Rixa jornalística, talvez? Helena não sabia. Na verdade, a adrenalina corria velozmente por todo seu corpo, fazendo-a ter calafrios de tempos em tempos devido a empolgação.

- Isso aí, caras maus. A Pequena Punk está chegando!

Berrou enquanto dirigia perigosamente pela Ponte Presidente Costa e Silva, que interligava a Cidade do Rio com Niterói. Mais um caso. Helena estava excitada para encontrá-lo e desvendá-lo de uma vez.

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